terça-feira, 19 de maio de 2009

Tema 4 - Conflito e Intervenção na Escola


Introdução
No âmbito da unidade de Relações Interpessoais pretende-se fazer uma abordagem dos princípios básicos de conflito, caracterizando-os do ponto de vista teórico, de acordo com a literatura consultada, ao mesmo tempo que se analisam determinadas situações, realçando a intencionalidade dos intervenientes e o tipo de discursos utilizados.

Caracterização de conflito / conflito na escola
Qualquer conflito resulta de uma perspectiva ou interesse divergente, relativamente a outros com os quais nos relacionamos, suscitando a sensação de que os objectivos das partes envolvidas não podem ser atingidos em simultâneo.
A escola como palco preferencial de relações e interacções surge como um local propício a conflitos, uma vez que abarca, no mesmo espaço, indivíduos diferentes, oriundos das mais diversas origens, contextos, formações, com propensão a demonstrar o que pensam e sentem nas mais variadas situações. A escola surge, hoje mais do que nunca, como espaço privilegiado para conflitos, daí que seja necessário dotar todos os intervenientes das “ferramentas” necessárias para conseguirem ultrapassar estas situações de forma pacífica e harmonizadora.
Ao contrário do que normalmente acontece, o conflito, de acordo com a sugestão de Deutsch (1973, citado por Costa e Matos, 2006) deve ser sempre encarado como algo neutro, contrastando com os seus resultados que podem ser positivos ou negativos, mediante a atitude que adoptamos perante o mesmo.
De acordo com Costa e Matos (2006), os efeitos negativos resultantes de um conflito são a desconfiança, a obstrução de cooperação, a perturbação das relações, o escalar das diferenças de posição que poderá conduzir a um confronto violento. Já os efeitos positivos podem ser vistos como o incentivo à discussão sobre diferentes assuntos, a promoção de formas construtivas de clarificação de divergências, tal como a sua resolução, o encorajar uma comunicação mais aberta e espontânea levando ao crescimento das diferentes partes envolvidas nesta relação conflituosa.
Se transportarmos esta realidade para as escolas, e de acordo com Johnson & Johnson, o conflito poderá assumir diferentes vertentes:
• Controvérsia – quando as ideias, informações, conclusões, teorias e opiniões de um sujeito são incompatíveis com as de outros e em que ambos procuram acordo. Quando abordada construtivamente, a controvérsia académica facilita a aprendizagem e a capacidade de tomar decisões, tal como a sua qualidade;
• Conceptual – quando há ideias incompatíveis, ou seja a informação recebida não é compatível com o conhecimento anterior;
• De interesses – dizem respeito às acções de um indivíduo, maximizando os seus objectivos, interferindo ou bloqueando as acções de outros que também pretendem atingir os seus fins;
• Desenvolvimental – relaciona-se com forças opostas de estabilidade e mudança que co-ocorrem em actividades incompatíveis entre adultos e crianças.

1. Estratégias de intervenção
De entre as estratégias utilizadas para a resolução de conflitos surgem algumas propostas interessantes e que serão alvo de análise mais detalhada, entre elas teremos as estratégias centradas nos indivíduos e nas relações interpessoais e as estratégias centradas nos sistemas, que abarcam, entre outros, os conflitos que surgem em contexto escolar.
1.1. Estratégias centradas nos indivíduos e nas relações interpessoais
Meneses (2003, citado por Costa e Matos, 2006) sugere a mediação de pares como uma das propostas mais usadas na resolução de conflitos, uma vez que lhes permite desenvolver características pessoais e interpessoais importantes, tais como a escuta activa, a paráfrase, a reformulação de ideias e o desempenho de papéis. O objectivo principal desta proposta consiste em gerar acordos aceitáveis para todos os envolvidos, para que estes passem a ser capazes de lidar com problemas idênticos, solucionando possíveis problemas, sem que para isso tenham de recorrer a um adulto.
Este tipo de proposta tem resultados extremamente positivos a diversos níveis, pois permite aos mediadores e mediados desempenharem papéis que os obriga a descentrarem a sua atenção de si mesmos, com o intuito de fornecerem cuidados a outros, aprendendo ao mesmo tempo a lidar com as divergências, tentando entender também o ponto de vista do outro. Para além disso, este tipo de estratégia confere aos intervenientes sentimentos de poder e controlo sobre as suas vidas, tal como a capacidade de tomar decisões que satisfaçam as suas necessidades e promovam o seu desenvolvimento psicossocial. Para além desta estratégia há que ter em conta que é necessário incentivar nos jovens a procura pela compreensão dos conflitos, para que consigam ultrapassar questões mais complicadas e evitar uma escalada para a violência, que infelizmente ainda é recorrente em muitas das nossas escolas, quer nas relações inter-pares (alunos/alunos), quer em relações de complementaridade (professores/alunos, pais/professores, pais/filhos…).
Pelas razões apontadas anteriormente, há a necessidade de cada vez mais criar nos jovens sentimentos de controlo e poder sobre as suas próprias vidas, bem como sobre a sua capacidade de resolução de problemas, satisfazendo, ao mesmo tempo, as suas necessidades. Desta feita, é importante seguir determinados passos, no sentido de promover a resolução dos problemas/conflitos. É necessário separar as pessoas do problema, para que cada um dos envolvidos seja capaz de reconhecer que podem haver percepções diferentes da sua, que têm de ser respeitadas; é importante reconhecer as emoções envolvidas neste processo, levando os intervenientes a partilhar os seus sentimentos e emoções, de forma a conduzi-los à resolução do conflito; é imprescindível reconhecer que o conflito é também uma forma de comunicação, daí que seja necessário ouvir e fazer-se ouvir, dando-se ênfase à metacomunicação, em que há real comunicação e valorização do que está a ser comunicado; é também extremamente importante aprender a diferenciar o foco nos interesses e não nas posições, pois uma vez que os interesses estão bem delineados há uma maior probabilidade de haver entendimento, visto as pessoas poderem negociar interesses mútuos, ultrapassando o conflito; e por fim é necessário criar oportunidades para encontrar opções ou alternativas distintas para se evitarem julgamentos precipitados que impeçam que se encontre uma verdadeira solução que sirva todas as partes.



1.2. Estratégias centradas nos sistemas
Se analisarmos as situações de conflito teremos que ter em conta que estes surgem sempre dentro de contextos muito específicos, que de certo modo os condicionam. Tendo em conta este facto, há que analisar estes conflitos a partir de uma perspectiva sistémica que nos permita uma maior compreensão da complexidade do conflito, oferecendo-nos ao mesmo tempo formas de lidar construtivamente com o mesmo, num contexto como o escolar.
No contexto escolar há a necessidade de criar uma cultura escolar, na qual estejam subjacentes competências sociais e emocionais que levem à redução de situações de violência e preconceitos, através da construção de relações equilibradas, promotoras de hábitos de vida saudável em comunidade. Para este fim, há que dotar os currículos de actividades comunitárias, centradas nos alunos, que visem a gestão da disciplina, o desenvolvimento social, emocional e académico harmonioso, incluindo tópicos como a gestão e resolução de conflitos, a gestão da fúria, a comunicação efectiva, valorizando-se a diversidade de opiniões e a redução de preconceitos.
Desta feita, pretende-se que os adultos funcionem como modelos, tendo este também de estar bem cientes das suas responsabilidades a este nível, pondo em prática competências que visem a resolução de conflitos, evitando a escalada de atitudes violentas, promovendo ainda uma comunicação efectiva ou mesmo a metacomunicação. Assim, temos de ter em consideração que os jovens não se encontram todos no mesmo nível desenvolvimental, pelo que será necessário empreender todos os esforços para que a mensagem chegue a todos e seja compreendida por todos os intervenientes. Ainda por esta razão, é necessário reconhecer que todos têm diferentes graus de responsabilidade, sendo imprescindível que haja adequação a cada situação conflituosa, nomeadamente por parte dos adultos, aos quais está atribuído, naturalmente, o papel de modelos e gestores de situações de conflito.
A este nível pretende-se essencialmente desenvolver nos alunos determinadas atitudes e comportamentos que visem a resolução de conflitos, nomeadamente que percebam qual o tipo de conflito em que estão envolvidos, que tenham consciência das causas e consequências do mesmo, que se respeitem a si próprios e aos outros, que compreendam e aceitem pontos de vista diferentes e diferenças culturais, que saibam distinguir interesses e posições, explorando-os através do diálogo, ouvindo atentamente e falando de forma a ser compreendido. Deste modo, os jovens poderão desenvolver competências essenciais à vida em sociedade, ao mesmo tempo que passam a conhecer-se melhor e a ver o outro que merece ser compreendido e respeitado. Assim podemos dizer que os diferentes níveis sistémicos serão respeitados e desenvolvidos nos alunos através da criação de disciplina, adaptação de currículos, ensinando os alunos a ultrapassar situações de conflito (pedagogia), cultivando uma cultura escolar que será depois transportada para a comunidade alargada, atingindo-se assim o quinto nível sistémico da resolução de conflitos.

Estudo de caso – o episódio passado na escola Secundária Carolina Michäelis
A situação passada na Escola Secundária Carolina Michäelis poderia não ter passado de mais uma situação de conflito e violência nas escolas, caso um aluno não tivesse filmado a situação e esta não tivesse passado para os órgãos de comunicação social. De qualquer das formas, tratou-se de uma situação grave em contexto de sala de aula, devido ao desrespeito demonstrado pela aluna e colegas de turma e também devido à falta de calma e ponderação, por parte da professora envolvida, que agiu sem reflectir.
No meu entender e à luz da bibliografia estudada, o professor, enquanto modelo comportamental e profissional, deve adoptar sempre uma atitude que evite situações de conflito, uma vez que deve ser encarado como autoridade a respeitar e exemplo a seguir. De qualquer das formas, a professora ao entrar em conflito directo com a aluna, provocou toda uma situação que levou a que a aluna e turma envolvidas, deixassem de lhe reconhecer a autoridade devida e assumissem uma atitude de desafio e total desrespeito. É evidente que é sempre mais fácil avaliar uma situação à qual somos alheios, no entanto e da experiência que tenho, a professora deveria ter optado por pedir à aluna que se retirasse da sala de aulas, uma vez que não estaria a cumprir uma norma de comportamento. Caso a aluna se recusasse a sair da sala, penso que a atitude mais correcta seria chamar um auxiliar de acção educativa e pedir-lhe que acompanhasse a aluna em questão ao Conselho Executivo, onde a aluna teria de se explicar, face ao desrespeito demonstrado. Penso que se a professora tivesse agido desta forma, o confronto não se teria dado.
Muitas vezes, os conflitos em sala de aula dão-se, essencialmente, devido à falta de calma e ponderação em relação à situação vivida. Porém, considero que o professor deverá adoptar sempre uma postura moderada face a este tipo de situações, analisando e agindo de forma ajustada, evitando conflitos reais, sejam estes entre alunos ou entre alunos e professores. Cabe ao professor, enquanto adulto e responsável pelo acompanhamento e formação de jovens, adoptar comportamentos que sirvam de exemplo aos que o rodeiam, promovendo o diálogo entre as partes e uma análise adequada da situação em questão.

Considerações Finais
No contexto escolar as situações de conflito devem ser encaradas como mais uma forma de crescimento e amadurecimento, devendo ser usados de forma a levar os jovens a compreenderem e respeitarem posições contrárias às suas, fomentando o diálogo/comunicação entre as partes, o respeito e tolerância essenciais para uma vida em sociedades plurais, multiculturais e multirraciais. A escola é o local, por excelência, para moldar pensamentos e atitudes, mediando e aconselhando nas diferentes situações, servindo de base para a criação de relações positivas na comunidade em geral.

Bibliografia

- Costa, Emília, Matos, Paula, 2006, Abordagem Sistémica do Conflito, Lisboa, Universidade Aberta

sábado, 2 de maio de 2009

Tema 3 - Perspectiva dialógica das Interacçóes


Um plano de acção tutorial pretende acima de tudo levar os alunos a uma melhor inserção e participação na vida escolar, conhecendo também as suas necessidades e interesses, no sentido de permitir a todos os intervenientes (comunidade escolar, em geral, e professores, em particular) ajudarem os alunos na formulação de um projecto de vida, passando por aspectos fundamentais, tais como a realização pessoal e verdadeira integração social. Neste sentido, este tipo de plano de acção tutorial tem raízes na teoria da actividade de Vygotsky, na medida em que se pretende organizar todo o processo educativo à volta da experiência pessoal de um indivíduo, com o intuito de o envolver em todo o processo de ensino aprendizagem, evitando uma ruptura com o espaço escola e consequentemente com a sua formação pessoal, social e até profissional.
A teoria defendida por Vygotsky baseia-se na Zona de Desenvolvimento Próximo que se refere à criação de situações de interacção social ou ambientes em que a criança recebe apoio, permitindo-lhe adquirir novas capacidades (skills), que lhes permitam a curto e a longo prazo ultrapassar dificuldades de diversas origens. É com base nos estudos levados a cabo por Vygotsky e seus seguidores que surge o Plano de Acção Tutorial, na medida em que se pretende criar ambientes escolares e sociais que permitam aos alunos com determinados problemas, ultrapassar as dificuldades e integrarem-se, de forma natural e adequada, ao meio em que estão inseridos, permitindo-lhes ainda “crescerem” como indivíduos diferentes dos restantes, mas socialmente integrados e participantes.
Assim, há que ter em conta aspectos individuais e sociais específicos, aquando da organização de um Plano de Accão Tutorial, uma vez que este tipo de plano visa ajudar os alunos a ultrapassarem dificuldades de integração no espaço escola/turma, aumentando a sua auto-estima, inserção escolar e social, adquirir hábitos de trabalho individual e em grupo, ultrapassando dificuldades de aprendizagem, que surjam ao longo do percurso escolar. Logo à partida é necessário traçarem-se os objectivos para este plano de forma clara e objectiva, tal como os públicos-alvo, a metodologia, as actividades a desenvolver, entre outros.
Objectivos Gerais
- Diagnosticar potencialidades e dificuldades do aluno e fazer o devido encaminhamento;
- Estimular o desenvolvimento de competências sociais, de convívio;
- Desenvolver actividades que promovam a auto-estima do aluno;
- Gerir conflitos ajudando o aluno a superar problemas de relacionamento;
- Prestar esclarecimentos aos alunos nas áreas em que apresentem questões;
- Promover e colaborar em acções de educação para os afectos
- Identificar e analisar as causas do absentismo, abandono e insucesso escolares e exclusão social, colaborando com a escola e pais e encarregados de educação no combate a estas situações;
- Apoiar os alunos no processo de desenvolvimento da sua identidade pessoal e do seu projecto de vida;
- Promover a relação família-escola;
- Diagnosticar e apoiar casos de famílias desfavorecidas;
- Promover parcerias com diferentes instituições (centros de saúde, associação de pais, centros desportivos, etc).
Evidentemente que é necessário delinear todo o processo, a fim de se identificarem os públicos-alvo deste tipo de plano, nomeadamente alunos com dificuldades de aprendizagem, com dificuldades de integração na escola/turma, alunos de famílias desestruturadas, com problemas sociais e financeiros que possam levar ao abandono escolar, insucesso e comportamentos disruptivos. Para além destes aspectos, é também extremamente importante estabelecer, de forma clara, as funções do professor tutor que será o responsável pelo acompanhamento de um determinado grupo de alunos que deverão ser, preferencialmente, acompanhados pelo mesmo tutor durante todo o seu percurso escolar. Este profissional deverá também reunir periodicamente com os alunos (encontros semanais) e com o conselho de turma, de forma a planificar e articular as actividades, adquirindo ainda uma visão global de todo o processo nas diferentes disciplinas.
Em suma, este tipo de plano, à luz das teorias defendidas por Vygotsky, funciona como uma ferramenta privilegiada no combate ao insucesso e abandono escolar, tal como na tentativa de ajudar os alunos a ultrapassarem dificuldades de integração nos grupos em que foram inseridos.

Bibliografia
- http://www.edu.helsinki.fi/activity/pages/chatanddwr/activitysystem/ (cedido online)
- http://communication.ucsd.edu/LCHC/MCA/Paper/Engestrom/expanding/ch3.htm (cedido online)
- Ramirez, M.J.J., Flores, Oscar, Pajarito, Elena, Un acercamiento a la orientación y tutoria en secundaria: la opinion de los estudiantes, (cedido online)
- http://www.uma.pt/carlosfino/publicações/11.pdf